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  • Foto do escritorArte Notes.

“Ova ortegrafia”


Livro

Escritora marcante “na interrogação do poder fundador da fala”, Maria Velho da Costa, nascida neste dia em 1938, tinha a preocupação frequente de testar discursos fora do seu momento mais oportuno, como é exemplo “Ova ortegrafia”, uma abordagem frontal da persistência da censura no Portugal de 1972.


«Ecidi escrever ortado; poupo assim o rabalho a quem me orta. Orque quem me orta é pago para me ortar. Também é um alariado, Também ofre o usto da ida. Orque a iteratura deve dar sinal da ircunstância, e não tem ustificação oral. E ais: deve ter em conta todos os ofrimentos, esmo e rincipalmente os daqueles ujo trabalho é zelar pela oralidade e ordem ública – os ortadores.


Eu acho que enho andado esavinda omigo e com a grei, com tanta liberdade de estilos e emas e xperimentalismos e rocadilhos que os ríticos e eitores dizem arrocos e os ortadores, pelo im, pelo ão,ortam. A iteratura eve ser uma oisa éria,e esponsável. Esta é a minha enúncia ública. (Eço desculpa de esitar nalguns ortes, mas é por pouco calhada neste bom modo de scrita usta ao empo e aos odos),


Izia eu que o ortoguês que ora, nesta ora de rudência e sforço, se não reduz a orma imples, não erve a vera íngua da Pátria. (Por enquanto só orto ao omeço, porque a arte de ortar não é fácil; rometo reinar-me até udo me air aturalmente ortado e ao eio e ao im.)


Outros jovens me eguirão o rilho. Odos não eremos emais para ervir na etaguarda os que, em árias frentes por nõs se mputam.


A issão do scritor é dar estemunho e efrigério aos e dos omentos raves da istória, ao erviço dos ideais da sua comunidade, ervir a oz do ovo, espeitar a oz dos overnantes egítimos.

Olegas, em ome da obrevivência da íngua,vos eço, pois: Reinai-vos a ortar-vos uns aos outros, omo eu me ortei.»


in “Desescrita”, Afrontamento (1973)



As suas primeiras redações escritas aos seis anos e lidas às outras meninas do colégio de freiras onde estudava serviram de motivação e ensaio para mais tarde ser escritora.


Licenciou-se em Filologia Germânica pela Universidade de Lisboa e tirou o curso de Grupo-Análise da Sociedade Portuguesa de Neurologia e Psiquiatria. Estreou-se em 1966 com um livro de contos, “O Lugar Comum”, ao qual se seguiu “Maina Mendes”, em 1969. Entre 1975 e 1977 foi presidente da Associação Portuguesa de Escritores, tendo afirmado na altura:


«Os regimes totalitários sabem que a palavra e o seu cume de fulgor, a literatura e a poesia, são um perigo. Por isso queimam, ignoram e analfabetizam, o que vem dar à mesma atrofia do espírito, mais pobreza na pobreza.»

Uma das autoras das “Novas Cartas Portuguesas”, pelo qual foi processada e julgada em 1972, ao lado de Maria Teresa Horta e Maria Isabel Barreno. Para ela, o aspecto mais emocionante deste livro era o facto de três mulheres, que estavam habituadas a escrever, se juntarem para redigir um livro em que experimentaram formas, pensamentos e estilos umas das outras. Esta dimensão de criação literária coletiva (sendo o processo de escrita normalmente um ato muito solitário) é a verdadeira dimensão revolucionária do livro.


Da sua vasta carreira literária chegam-nos romances como “Casas Pardas” (1977) e “Missa in Albis” (1988), poesia como “Cravo” (1975), onde se pode encontrar o poema «Revolução e Mulher», e também crónicas, contos, teatro e ainda escrita argumentista para filmes de João César Monteiro, Alberto Seixas Santos ou Margarida Gil. Será sempre recordada como uma das vozes mais fundas e insubmissas da literatura portuguesa.


Distinguida com o Prémio Vergílio Ferreira (1997); o Prémio Camões (2002); Prémio Correntes de Escritas (2008); Grande Prémio de Literatura dst (2010). Agraciada com a Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique de Portugal (2003) e a Grande-Oficial da Ordem da Liberdade de Portugal (2011). Em 2020, a SPA criou ainda em sua homenagem o Prémio de Literatura Maria Velho Costa.

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